Ideia é mostrar que a realidade não é maniqueísta, que as pessoas não são perfeitas e que elas podem aprender com os erros
Narrativas que trabalham com personagens maniqueístas – em geral, histórias simplificadas e estereotipadas, em que há um vilão e um herói típico – nem sempre são as mais adequadas para estimular boas reflexões do ponto de vista da aprendizagem socioemocional. Isso porque as pessoas não são sempre boas ou ruins.“Como regra, não há vilões e mocinhos no mundo real. A realidade não é maniqueísta. As pessoas têm momentos em que elas se aproximam mais de comportamentos pró-sociais e outros em que agem de modo não tão apropriado assim”, diz Eduardo Calbucci, professor e um dos autores do Programa Semente.Para ele, a reflexão que tem que ser feita deve mostrar que essas categorias de bem e de mal não são absolutas e que é natural todos nós oscilarmos, em diferentes momentos, entre comportamentos mais ou menos positivos.Ele explica que, ao longo da vida escolar das crianças e adolescentes, é importante tentar desmistificar essa questão, pois o risco seria criar um padrão inatingível, o do grande herói, o que pode levar a uma distorção cognitiva: a superexigência. Ela faz com que as pessoas fiquem permanentemente infelizes, porque nunca conseguem atingir o padrão que elas mesmas estabeleceram.“A pessoa começa a olhar o padrão de comportamento do herói e avalia que nunca conseguirá fazer as coisas daquela maneira. Por outro lado, ao perceber que ela tem algumas atitudes habitualmente atribuídas aos vilões, ela se questiona se não é um deles”.
Cinema e séries atuais
Segundo ele, de certo modo, o cinema e as séries hoje já começam a tratar dessas ambiguidades, mostrando que o super-herói também tem seus momentos de atitudes inadequadas e aqueles habitualmente caracterizados como vilões podem ter comportamentos que conseguimos explicar – caso do filme “Coringa”.A série “La Casa de Papel”, que muitos adolescentes viram, é outro exemplo. As pessoas costumam torcer pelos assaltantes, pois se estabelece um conflito em que eles parecem representar valores mais positivos do que a polícia.“A gente deve buscar histórias e narrativas que fujam da estereotipação e permitam encontrar pessoas de carne e osso, que são imperfeitas, mas que podem aprender com os próprios erros e deslizes. O vilão clássico é aquele que nunca aprende”, afirma Calbucci.