Construir uma escola antirracista é uma necessidade social. Para isso, é preciso formar estudantes que consigam, a partir do diálogo entre professores e estudantes, conhecer as origens plurais do povo brasileiro e identificar ações racistas individuais e coletivas, que ainda hoje são tão presentes no Brasil.
Para construir esse modelo de escola, as instituições de ensino brasileiras devem estar atentas à pluralidade da nossa história, firmando um compromisso com um aprendizado que tenha como um de seus princípios o reconhecimento do outro como ser humano dotado de direitos.
Antes de mais nada, é importante que entendamos alguns conceitos vitais, como antirracismo e racismo estrutural, de acordo com o entendimento mais contemporâneo sobre esse assunto.
O que é o antirracismo?
O movimento antirracista é uma das recentes manifestações do movimento negro, que pode ser compreendido como um conjunto de reivindicações a favor da igualdade racial, com ênfase nas as estratégias de ação contra o ódio à etnia preta.
Esse processo de luta e de conscientização tem revisado alguns pontos da história brasileira que foram deixados de lado grupos sociais dominantes.
O tema tem gerado cada vez mais interesse da sociedade civil, que procura encontrar especialistas que possam ajudar a tornar a cultura brasileira mais acolhedora e respeitosa. Nesse sentido, vale a leitura da obra Pequeno manual antirracista, de Djamila Ribeiro.
O antirracismo encoraja as pessoas a combater a perpetuação dessa cultura que marginaliza, inferioriza e maltrata pessoas negras em todo o mundo. Não basta não ser racista. É preciso ser antirracista.
O que é o racismo estrutural?
Racismo estrutural é um conceito utilizado para explicar como as sociedades modernas se estruturaram com base na discriminação de determinados grupos sociais. Em outras palavras, a discriminação é o modus operandi do progresso da civilização moderna.
Um dos principais intelectuais e expoentes do assunto, Silvio Almeida, escreveu o livro Racismo estrutural para explicar mais detalhadamente o assunto. Compartilhamos um vídeo dele definindo o termo:
https://youtu.be/PD4Ew5DIGrU
O mais interessante disso tudo é que a luta contra o racismo não tem um “fim”. É um processo constante, que exige proatividade e orientação educacional, a fim de promover uma sociedade mais igualitária, mais empática e mais respeitosa em relação a diferentes culturas e etnias.
E como promover o antirracismo dentro da sala de aula? Pensando nisso, o professor Augusto da Silva, coautor do Programa Semente, deu algumas orientações sobre o tema.
Como promover uma escola antirracista?
“Acho que a primeira ação é admitir que somos uma sociedade racista. Vivemos em uma sociedade pautada pelo racismo estrutural, que se manifesta, muitas vezes, sem que as pessoas percebam. A construção histórica deste país se fundamentou em um processo de ‘naturalização’ das ações racistas”, diz Augusto.
Segundo o professor, os estudantes que chegam às escolas não estão fora deste contexto social. “Só o fato de muitos alunos não terem contato com professores e colegas negros já cria um distanciamento social. Isso também vale em relação à cultura indígena.”
Ele também reforça que não é uma coisa simples “olhar no espelho” e identificar uma imagem que não nos agrada. Para isso, Florestan Fernandes, renomado sociólogo brasileiro: “o Brasil tem preconceito de ter preconceito”.
É muito comum as pessoas tentarem se defender de acusações de atos e comentários racistas dizendo que tem amigos negros. Mas esse argumento transfere para as relações privadas uma discussão que precisa ser coletiva.
“Enquanto não nos enxergamos como uma sociedade fundamentada em atos racistas, caracterizada pela exclusão social e econômica que inclui a diferença da ‘cor de pele’ e que desconsidera o respeito às diferenças culturais dos povos que formam o país, não poderemos construir uma escola antirracista”, afirma.
Tudo pode começar pelo planejamento pedagógico da escola, a partir das reuniões dos professores, colocando o assunto como uma pauta importante nas discussões que a escola pretende promover.
Assim, os professores e coordenadores pedagógicos poderão desenvolver um discurso comum, planejando abordar o tema em determinados momentos do ano e ajudando os estudantes a notar os problemas e contradições promovidas por atos racistas.
Combater a exclusão social e racial é uma luta de todos. Lembrar aos estudantes que as desigualdades não são naturais e que combatê-las é essencial é um passo importante para que os jovens se tornem capazes de mudar o mundo, como protagonistas de suas próprias histórias. Só assim poderemos construir uma escola antirracista.
Como falar sobre o racismo em sala de aula?
A construção histórico-cultural do Brasil tem a contribuição intelectual de várias pessoas, independente do gênero, da religiosidade ou da origem étnica. Trata-se de um processo marcado por uma profunda diversidade.
É senso comum associar a história dos povos negros à condição de pessoas escravizadas, mas é preciso ir muito além disso. Compartilhar com os alunos a luta dos povos negros pela liberdade, destacando seu protagonismo nossa formação cultural, é um bom caminho.
Além disso, de acordo com o professor Augusto, as escolas podem apresentar personalidades negras, para que os alunos se acostumem com “rostos diferentes”: Dandara dos Palmares e Luiza Mahin, o escritor Machado de Assis, o escultor Antônio Francisco Lisboa (mais conhecido como Aleijadinho), os engenheiros Antônio e André Rebouças, o arquiteto Joaquim Pinto de Oliveira (mais conhecido como Tebas), o advogado Luiz Gama e tantos outros nomes podem ser lembrados.
Dessa forma, pode-se provocar os estudantes a identificar, entre os todos os povos que formam o Brasil, as pessoas pretas que se tornaram fundamentais na edificação do país.